14 de dez. de 2008

Coluna Diário Motorsport - Nº 18 - Domingo, 14 de dezembro de 2008

AUTOMOBILISMO DO CEARÁ:

MODELO PARA O BRASIL


Grid cheio no Autódromo Virgílio Távora, em Eusébio CE)

Foto João Filho


Os esportistas e dirigentes do Ceará encontraram uma forma prática e inteligente de driblar os custos do automobilismo regional. Na forma de cooperativa, foi criada a categoria Super Turismo e o grid de 35 carros só não é maior porque é essa a capacidade do Autódromo Internacional Virgílio Távora, em Eusébio (CE). Houve, inclusive, a devolução de dinheiro porque a venda inicial previa mais carros na pista.Criada em 1999 com o objetivo de alavancar a Copa Corsa cearense, a Associação de Pilotos de Turismo (APT) já tinha esse histórico de mobilização, que garantiu a manutenção do campeonato até 2003. No ano seguinte, ainda com o mesmo equipamento monomarca da Chevrolet, foi criada a Super Turismo. Nesse período, além de os associados manifestarem o desejo de um novo pacote técnico, o equipamento já estava superado.


DESAFIO PARA EQUILIBRAR CUSTO E PERFORMANCE

Para estimular ainda mais essa operação, a criação da categoria CTM 2000, que foi lançada no ano passado e esteve nas pistas do Nordeste em 2007, deu o impulso que faltava para a implantação do novo projeto. Sob a presidência de Ênio Santos, foi tomada a decisão pela mudança. Tendo contado como presidentes os pilotos Carlos Alberto Pontes, Alfredo Ibiapina, Airton Vasconcelos, Ramiro Milfont, Vicente Paiva, Maurilio Reis e Raul Fontenelle, a APT já tinha experiência nas decisões participativas e na presença como consultor do presidente da Federação Cearense de Automobilismo, Haroldo Scipião. Mas agora o desafio se mostrava muito maior e a fórmula encontrada deve ser analisada de maneira profunda, visto que os resultados são surpreendentes.


CARRO A PRESTAÇÃO

Os primeiros esboços estéticos do carro foram executados pelo arquiteto Airton Vasconcelos. O que veio a seguir, após a entusiasmada participação de todos no visual do carro e a sua aprovação no final de 2006, entrou em o engenheiro Pedro Virgínio, conhecido no cenário do automobilismo brasileiro pelos projetos e construção de carros como o Espron e o CTM 2000.A adesão dos associados da APT foi tão imediata que a empreitada inicial de 24 chassis precisou ser ampliada para 36 por força da aceitação. Além disso, a forma encontrada para pagar o carro cabia no bolso dos competidores. O preço estabelecido foi de R$ 6.500 pelo conjunto chassi/bolha de fibra completa, pago durante o ano de 2007 em dez prestações de R$ 650.


No galpão principal da APT, em Eusébio (CE), Raul Fontenele, Haroldo Scipião, Enio Santos, Maurício Reis e Paulo Holanda (Da esquerda para a direita)

Foto João Filho



PROGRAMAÇÃO FINANCEIRA

O presidente Ênio Santo explica que foi feita uma ampla programação financeira pela APT e tudo o que era comprado para a montagem dos carros passava pelo rateio de 36 partes iguais, sem exceção. Nesse formato, sempre em grande volume, foram comprados rodas, tanques de combustível, peças de montagem e reposição etc. Enquanto o dono da Proton trabalhava para traduzir em projeto técnico os objetivos da APT, as competições com os valentes Chevrolet Corsa continuavam normalmente. A pressa para a sua conclusão não foi elemento do processo, mas a sua eficiência técnica e operacionalidade.


PLANEJAMENTO

O primeiro semestre de 2007 foi dedicado à execução do primeiro protótipo, que no mês de julho do mesmo ano já surgiu como Safety Car da derradeira temporada dos Corsa, mas já com o nome de Super Turismo. Se esse primeiro período já foi de estudos entre o Pedro Virgínio, Haroldo Scipião e os membros da APT, a intensidade ficou muito maior porque o protótipo passou a ser testado continuamente, gerando alterações no projeto técnico até o modelo definitivo, inteiramente dentro das normas técnicas e de segurança da FIA e da Confederação Brasileira de Automobilismo.Em outubro de 2007, todos os 36 chassis e as bolhas de fibra de vidro já estavam prontos. Faltava, então, a montagem dos carros. Foi quando outro desafio foi assumido pelo engenheiro Pedro Virgínio. Ele foi contratado para fazer uma espécie de linha de produção para a montagem completa de todos os carros, entre outubro e maio de 2008. Linha essa que passou a ser alimentada pelo material comprado pela APT, sempre em várias parcelas iguais para cada associado. Esse processo precisou aguardar o término da temporada dos Corsa para que entrasse em prática outra alternativa de barateamento criada pela Associação.


RECICLAGEM

Tendo em vista o patrimônio que seus membros já possuíam, a mecânica básica do novo carro foi a do modelo da General Motors. Dessa forma, ao término do campeonato, todos os carros foram desmontados e analisado, caso a caso, o que poderia ser ou não aproveitado na montagem. Suspensão, motor, transmissão, entre outros, foram equipamentos que migraram do monobloco para o chassi tubular sem problemas. E a reutilização só não foi mais ampla porque, em alguns casos, não havia condições técnicas. Além disso, a Federação determinou que bancos e cintos de segurança deveriam ser todos novos e de acordo com as normas de segurança da CBA.


OS CUSTOS

Ao final desse processo, quando os carros estavam alinhados para a primeira corrida, no mês de junho, cada piloto tinha investido entre R$ 15.000 e R$ 35.000, como custo total, dependendo da quantidade de peças que cada um tinha aproveitado do modelo anterior. Quem optou por ter tudo novo, obviamente, teve um desembolso maior. Todos os carros são lacrados em itens como amortecedores, eixo, motor, câmbio. O piloto pode fazer algumas regulagens, permitidas pelo regulamento, mas somente quando o carro for para a pista em situação de corrida, que só deixam a sede da associação na sexta-feira que antecede a prova. Em caso da necessidade de um reparo maior, o carro sai da Associação, sob autorização, para um fornecedor credenciado e, no retorno, todos os lacres são conferidos. Existe, inclusive, uma tabela fechada de preços para que o piloto não seja surpreendido com gastos não previstos.


CONTROLE ORÇAMENTÁRIO

Para manter os custos controlados e não permitir discrepâncias técnicas, a associação tem técnicos contratados que cuidam, em separado, de cada conjunto nas instalações da APT. Assim, Fábio Araripe é o responsável pela preparação dos motores, Rogério Maciel cuida das caixas de câmbio e a parte elétrica é função exclusiva de Carlos Bento da Silva. O trabalho de manutenção desses componentes, os serviços e o custeio da APT são cobertos por uma taxa de R$ 350 por mês. Já com relação ao custo de corrida de cada um, a Associação não se envolve. O regulamento determina que cada competidor tem de usar no mínimo dois pneus novos na dianteira, com subsídio da revenda local da Michelin, o que sai em torno de R$ 400. A inscrição por prova custa R$ 1.000, estando incluído aí o combustível de corrida e a estrutura do evento da Associação. Por determinação da assembléia, todos pagam, independentemente de participar do evento ou não.O que sobra como custo extra para o piloto é a mão-de-obra de pista que cada piloto tem a sua própria. No cômputo geral, afirmar que o custo por prova sai em torno de R$ 3.000 é bem perto da realidade de uma iniciativa modelo para quem quer automobilismo barato, equilibrado e com grande participação dos interessados.


Sede da Associação de Pilotos de Turismo, em Eusébio CE)

Foto João Filho


Matéria de minha autoria publicada originalmente na Motorsport Brasil nº 31

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